Episódio de violência em condomínio gera a expulsão de morador

Uma disputa foi instalada por vizinhos em um condomínio do Rio de Janeiro. Cada um entra na confusão para defender seu filho e logo o desentendimento acaba se tornando briga de gente grande. As cenas são da série Os Outros, da plataforma de streaming GloboPlay, mas nas telas dos noticiários a realidade também traz, cada vez mais, os condomínios como cenário de episódios de violência. São casos recentes em Manaus, João Pessoa e ainda Salvador, que podem, segundo especialistas, levar até a expulsão do morador envolvido.

Na capital do Amazonas, as cenas de um casal de moradores agredindo uma babá e atirando contra um vizinho na garagem do condomínio viraram caso de polícia. Os agressores foram presos, mas também viraram alvo de um pedido de afastamento do prédio. A administração do condomínio realizou uma assembleia extraordinária para discutir o caso e depois pediu à Justiça que a dupla fosse impedida do convívio social com outros moradores do local. Advogado especialista em direito imobiliário, Edson Salomão explica que isso é possível sendo o morador proprietário ou  até mesmo inquilino.

“O próprio Código Civil prevê o chamado comportamento antissocial, que é quando o condômino se recusa a respeitar as regras de convivência, e isso inclui agressividade e violência. Já temos vários casos recentes que o condomínio entrou com uma ação pedindo afastamento e o juiz determinou a expulsão, inclusive de proprietários, por conduta antissocial. Mas para que ela seja considerada antissocial deve ser algo reiterado”, esclarece o advogado.

Em um dos condomínios administrados pelo síndico profissional Ary Cabral em Salvador, um morador chegou a ser expulso no ano passado, após um episódio de violência. Armado com um facão, o homem tentou invadir a portaria e atacar um funcionário. O profissional precisou se jogar de uma altura de três metros para fugir do ataque. Como ele era inquilino, a administração do condomínio conversou com o proprietário, que negociou para que o agressor deixasse o imóvel sem a necessidade de recorrer à Justiça.

Esse foi um dos 11 episódios de agressão contabilizados no último ano por Ary, que administra 24 condomínios na capital baiana. O síndico acredita que o aumento no número de casos começou logo no início da pandemia da Covid-19 e vem perdurando até hoje.  

“Naquele período, as pessoas ficaram mais tempo em casa, mais estressadas, com menos paciência com os vizinhos. E aí começaram os desentendimentos de vizinho com vizinho, com funcionário e até com síndico. Eu mesmo já recebi ameaças. Chegou a um índice que nunca tinha visto antes. É assustador mesmo”, conta Ary.

De acordo com o síndico profissional, os campeões na motivação das brigas são os animais de estimação, barulho e garagem. Outro vilão que tem estimulado os desentendimentos e trocas de agressões nos condomínios são, segundo Ary, os grupos de Whatsapp. Com esse cenário, o síndico se diz ainda mais em alerta para intervir em qualquer situação que dê indícios de uma possível confusão. “Afinal, se deixar para um morador ir resolver com o outro, com certeza vem o atrito”, afirma.

“Trabalhamos com muitas circulares justamente para evitar e alertar. O primeiro comunicado geralmente vai para todos os moradores e o segundo já vai direto para aqueles que estão envolvidos no conflito.  Orientamos também que o condomínio os reúna no escritório de um advogado para lavrar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), se comprometendo a tentar uma convivência harmônica, mas muitas vezes eles são resistente”, conta Ary.

Esse tipo de conduta do síndico pode não só evitar as vias de fato, mas também dar subsídios ao condomínio se futuramente for preciso recorrer à Justiça, em um pedido, por exemplo, de afastamento do morador envolvido no conflito. Segundo Salomão, que nesses casos vai fazer toda a diferença ter um histórico de medidas utilizadas para tentar coibir comportamentos antissociais. Pode ser aplicação de multas, notificações ou advertência, vai depender do que é previsto pelo regimento interno do condomínio.

Assessoria jurídica
A preocupação de Ary com o aumento dos casos de agressão é tamanha que a AC Condominial, empresa de síndicos profissionais administrada por ele, chegou a contratar uma assessoria jurídica especializada na área criminal. Isso porque ele sabe que condomínio pode ser responsabilizado ou envolvido em casos de agressões ocorridas nas áreas comuns. O advogado especialista em direito imobiliário explica que se houver, por exemplo, omissão na comunicação às autoridades policiais, o condomínio certamente será responsabilizado. E, de acordo com ele, não são raras as administrações que optam por tentar abafar os casos.

“O síndico ou administrador deve comunicar a agressão às autoridades competentes e deve ainda orientar os funcionários a fazerem o mesmo”, alerta o advogado. Salomão lembra que foi justamente neste sentido a promulgação de uma lei estadual de 2020, que obriga os condomínios residenciais da Bahia a comunicar ocorrência de casos de violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, adolescentes ou idosos.

O síndico profissional André Ramos tem trabalhado essas questões com sua equipe. Ele conta que recentemente se reuniu com funcionários de um dos três condomínios onde atua, para orientá-los a ficar mais atentos em situações específicas,  que julga que podem evoluir para uma agressão. 

“Tem sido muito difícil porque as pessoas estão muito à flor da pele. E quando acontece algo, a gente sabe que a primeira responsabilidade é do síndico, de chamar a polícia, de buscar a Justiça. Mas antes disso, buscamos evitar, mediar os conflitos, conversar separadamente com cada morador e resolver da melhor forma possível. A depender do conflito, o funcionário acaba, muitas vezes, entrando depois como testemunha, então eles precisam ser orientados também”, avalia Ramos.

Outra preocupação do síndico é com relação às câmeras de segurança do condomínio. Ele já sabe, por exemplo, que deve fornecer as imagens de uma eventual agressão apenas para as autoridades policiais e caso elas façam o pedido. A recomendação do advogado é que o síndico evite entregar as gravações até mesmo para os envolvidos no conflito. “É um material que está sob sigilo, então a orientação é que ele seja visto ou entregue apenas às autoridades competentes”, afirma Salomão.

Fonte: Portal A Tarde