Juiz pode fixar dano moral maior que o previsto na CLT

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por maioria de votos, a validade do tabelamento de valores de danos morais trabalhistas. Mas entendeu que os critérios de quantificação da reparação, previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), devem servir apenas de orientação para os julgadores.

Para os ministros, será possível fixar valores superiores aos limites máximos quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade.

O julgamento foi encerrado na sexta-feira no Plenário Virtual. Estavam sob análise três ações sobre o assunto. Elas tratam de dispositivos inseridos na CLT pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017).

Ao estabelecer os parâmetros das indenizações, o artigo 223-G da CLT classifica as ofensas, com base na gravidade do dano causado, em leve (até três vezes o último salário), média (até cinco vezes), grave (até 20 vezes) ou gravíssima (até 50 vezes).

O caso estava suspenso desde outubro de 2021. O julgamento foi retomado com o voto-vista do ministro Nunes Marques, que seguiu o entendimento do relator, o ministro Gilmar Mendes.

De acordo com o relator, a reforma trabalhista, ao estabelecer parâmetros para a fixação do valor indenizatório dos danos extrapatrimoniais buscou, de certa forma, garantir um mínimo de isonomia, tanto em relação aos empregadores quanto em relação aos empregados, diante da discrepância das decisões judiciais no país.

Mas, por outro lado, acrescenta em seu voto, justamente por se tratar de dano extrapatrimonial, que atinge a esfera de personalidade da pessoa, a escolha de um parâmetro de uniformização deve, igualmente, respeitar a individualidade do sofrimento causado e não gerar ainda mais discriminação.

Para o ministro, os critérios de quantificação da reparação previstos no artigo 223-G da CLT poderão orientar o magistrado trabalhista na fundamentação de sua decisão. Mas o tabelamento deve ser utilizado como parâmetro, e não como teto.

Portanto, segundo Mendes, consideradas as circunstâncias do caso concreto, seria constitucional o arbitramento judicial do dano em valores superiores aos limites máximos previstos na CLT.

Em seu voto-vista, o ministro Nunes Marques destaca que, hoje, a definição do valor da indenização por danos morais, decorre, em grande medida, de padrões “vagamente fixados” pela jurisprudência e de apreciação subjetiva das provas por parte do juiz.

“Nesse contexto de imprecisão, não vejo razões de ordem constitucional que impeçam, em tese, o Poder Legislativo de estipular valores referenciais com o intuito de inibir estimativas abusivas ou irrisórias e, até mesmo, de indicar um estalão para efeito comparativo”, afirma.

Nunes Marques pondera que essa medida legislativa precisaria lançar mão de parâmetros razoáveis e preservar certa margem de discricionariedade para que o juiz possa lidar com casos atípicos, sob pena de supressão do núcleo essencial da função jurisdicional.

Para o ministro, contudo, o salário do ofendido não pode servir de única referência. Uma coisa é o legislador estabelecer padrões, outra, segundo Nunes Marques, é confinar a indenização a um valor certo máximo.

“Convém admitir que os critérios da lei impugnada sejam tomados como referenciais indicativos e os juízes, em cada caso, possam fundamentadamente extrapolá-los”, declara o ministro em seu voto.

Além de Nunes Marques, o voto do relator foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e André Mendonça. Os ministros Edson Fachin e Rosa Weber divergiram e ficaram vencidos (ADI 6050,ADI 6069 e ADI 6082).

De acordo com Hugo Luiz Schiavo, advogado trabalhista e sócio do A.C. Burlamaqui Consultores,o julgamento do STF “altera profundamente” afixação de valores da indenização dos danos morais trabalhistas. “Esse teto deixa de existir, não é mais teto, é apenas uma tabela”, afirma.

O voto do relator, diz ele, ao afastar a possibilidade de se limitar indenizações com a tarifação de valores prevista na CLT, segue a jurisprudência histórica do STF em situações similares — fora da área trabalhista.

O STF já definiu, por exemplo, que indenizações pela Lei de Imprensa também não podem sertabeladas (RE 447584). Por outro lado, o advogado destaca que é importante haver uma baliza pela tabela, para não deixar o valor que pode ser fixado muito abrangente.

Fonte: Valor Econômico