O efeito Airbnb

No início de junho, Florença, na Itália, anunciou a proibição de aluguéis de curto prazo em seu centro histórico. A medida afeta serviços já comuns como Airbnb e Booking.com, que popularizaram a oferta e demanda, e facilitam a vida entre anfitriões – quem loca – e hóspedes. No entanto, o crescimento da modalidade tem consequências. Em 2022, o Airbnb encerrou o ano com 6,6 milhões de imóveis cadastrados. Na capital da Toscana, isso significou redução de locações de longo prazo, ou seja, é difícil encontrar moradia. “O problema se tornou estrutural”, resumiu Dario Nardella, o prefeito. A discussão não é de hoje. Em 2021, o governo italiano foi alertado por gestores a respeito de uma regulamentação, pois havia um reflexo no aumento do aluguel para residentes. Em Milão, Roma e Bolonha, estudantes universitários foram às ruas protestar. Eles alegam não encontrar residências próximas às faculdades para o ano letivo. A manifestação consiste em armar acampamento para alertar sobre o preço do aluguel. Em Roma, um quarto não sai por menos de 500 euros (cerca de R$ 2.600). “Um privilégio que poucos podem pagar”, reclamam, em cartazes. O Ministério da Universidade e da Pesquisa da Itália se mexeu e criou um grupo para avaliar o tema. A Europa cria mecanismos perante a pressão da população, setor imobiliário e rede hoteleira.

Em Nova York, nos Estados Unidos, há uma lei que restringe a prática diante de uma crise de moradias populares. Lá, os chamados anfitriões precisam se registrar na prefeitura e seguir códigos de manutenção e construção, por exemplo. O Airbnb move um processo contra a cidade por considerar a medida “extrema e opressiva”. A Prefeitura, por sua vez, reforça que o objetivo é “proteger a segurança e habitabilidade da comunidade para os residentes, preservar o estoque permanente de moradias”. O valor médio para alugar um apartamento em Manhattan é de R$ 19 mil ao mês. Não à toa, o recente relatório NYC Trus Cost of Living (Custo de Vida Verdadeiro de NY, em tradução livre) apontou que metade das famílias da cidade não tem dinheito para continuar vivendo na região.

No Brasil, condomínios discutem as opções de curta temporada. Pontos que vão de segurança aos incômodos com festas são levados por moradores. “Em decisões recentes, o Superior Tribunal de Justiça se manifestou dizendo: ‘em condomínios de natureza exclusivamente residencial, essas locações podem ser vetadas pela assembleia’. Sob argumento de que se aproximam de um contrato típico de hospedagem”, dia Marcelo Borges, diretor de Condomínio e Locação da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis. “Vamos chegar a um momento de modulação. Não podemos negar que a locação por temporada é prevista em lei. Talvez o Brasil precise de restrições assim como Nova York. Controle, não proibição. “O debate é levado no mesmo tom por Manoel Linhares, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis. “O que desejamos é poder igualitário”, enfatiza. “O que seria isso? Os hotéis pagaram Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) comercial. Esses apartamentos pagam o IPTU residencial. O setor hoteleiro arca com o Imposto Sobre Serviços. Se nós pagamos essa carga tributária, porque eles não? É preciso mexer na Lei do Inquilinato urgente”.

Para Valter Caldana, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, essa já é uma questão pública prioritária. “O poder público deve se atentar e acompanhar com atenção esta movimentação nos grandes centros mundiais para implementar aqui medidas preventivas e mitigadoras antes que o problema se torne maior”, analisa.

Referência na modalidade no Brasil e mundo afora, o Airbnb afirma a intenção de ser “parceiro de municípios, estados e países”. Em nota enviada à ISTOÉ, a empresa ressalta que a companha as determinações e necessidades locais dos mercados. “E se esforça para apoiar as comunidades, estabelecendo parcerias com governos municipais e estaduais e expansão do turismo”. E destaca: “Boas políticas podem criar oportunidade tanto para proprietários de imóveis obterem renda extra, quanto para o impacto econômico”.

Segundo estudo da Oxford Economics, realizado a pedido do Airbnb em 2022, os gastos de hóspedes que fizeram reservas por meio do sistema no Brasil totalizaram US$ 5,2 bilhões.

Fonte: ISTOÉ