Expulsão de dono do próprio imóvel na Praia do Canto é mantida pela Justiça

A expulsão de um empresário de 66 anos do seu próprio imóvel na Praia do Canto, em Vitória, foi mantida pela Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). Ele foi acusado de comportamento antissocial, que vem se repetindo desde 2017 e que põe em risco a segurança dos demais moradores do prédio, assim como a dos funcionários.

Em sua decisão, os desembargadores assinalam que ficou “comprovado que o recorrente (empresário) adotou diversas condutas antissociais”. Na sequência, elencam algumas das ações por ele praticadas.

"Praticar agressões e brigas no condomínio, arrombamentos, vandalismo, ameaça a funcionários do edifício, estacionamento de veículo em locais impróprios, excesso de barulho, odor de cigarro nos corredores, sendo recalcitrante no cumprimento das normas estabelecidas pelo condomínio."

Acrescentaram ainda que, segundo a jurisprudência do próprio Tribunal de Justiça, “a demonstração de comportamentos antissociais, sendo ineficazes as medidas tomadas pelo condomínio e a insuportabilidade da vida em comum, podem justificar o afastamento do condômino antissocial”.

Em outro ponto da mesma decisão, os desembargadores assinalam ainda que o empresário foi “devidamente notificado das penalidades aplicadas, especialmente da realização da assembleia na qual foi deliberada sua retirada do imóvel, não há motivos para reformar a decisão que determinou o seu afastamento do condomínio agravado”.

Dessa forma, eles negaram, por unanimidade, no último dia 9, o recurso apresentado pelo empresário e mantiveram a decisão do juiz Leonardo Mannarino Teixeira Lopes, da 6ª Vara Cível de Vitória. Ele havia dado prazo para que o empresário deixasse o imóvel até o final de janeiro deste ano, o que foi cumprido.

Comportamento antissocial
Em sua decisão, o juiz Leonardo Mannarino Teixeira Lopes, da 6ª Vara Cível de Vitória, destaca sobre o comportamento e ações do empresário: “A meu ver, não só são capazes de perturbar o sossego dos condôminos, como também colocam em risco a segurança de todos os moradores e funcionários do condomínio”. E descreve as seguintes ações, praticadas pelo empresário:

- Recebia visitantes/hóspedes, supostamente usuários de drogas
- Agressões e brigas entre ele e os seus visitantes/hóspedes, supostamente usuários de drogas
- Agressão praticada contra moradora
- Arrombamentos
- Vandalismo
- Ameaças a funcionários do prédio, praticadas por ele e por seus hóspedes/visitantes
- Veículo estacionado em locais indevidos
- Excesso de barulho
- Odor de cigarro nos corredores
- Trânsito nos elevadores com pouca roupa
- Proprietário e hóspedes/visitantes batiam portas bruscamente, gerando barulho, em diversos horários
- Recebia visitantes/hóspedes que não eram identificados e não aceitavam ser identificados pelos funcionários
- Funcionários passaram a ser ameaçados por não autorizar a entrada dos visitantes/hóspedes
- Portas arrombadas
- Funcionários não conseguiam impedir ou tirar da portaria os visitantes que não eram autorizados pelo empresário a subir. Em outras ocasiões ele anunciava que iria descer e não o fazia, o que gerava revolta nos visitantes
- Os hóspedes/visitante do empresário também causavam brigas no apartamento e nos corredores e garagens

Em decorrência dos problemas sucessivos, o condomínio passou a enfrentar diversos problemas, como:

- Recebimento de áudios de outros moradores desesperados com a situação
- Inquilina entregou apartamento por não suportar barulho e odor de cigarro
- Motim de funcionários próprios do condomínio e de terceirizados em abandonar a portaria, com medo
- Funcionárias da limpeza tinham dificuldades de fazer seu trabalho
- Imagens do empresário no corredor lateral do prédio, onde deixava o carro abandonado, sendo perseguido a gritos por outro homem estranho ao condomínio
- Multas aplicadas ao empresário que não eram pagas
- Até a Polícia Militar, ao atender a ocorrência, informava que já sabia dos problemas e “que já tinha abordado ele (empresário) com o carro cheio de nóias”, foi o relato do policial.

Na decisão do juiz Mannarino, é informado que o entra e sai de pessoas sem identificação que visitavam ou se hospedavam com o empresário era tão grande, que ele solicitava para ver as imagens de segurança do prédio e assim saber quem entrou e saiu de seu apartamento.

Embora o processo não esteja tramitando sob sigilo na Justiça estadual, o nome do prédio, do advogado do condomínio e o do proprietário que foi declarado condômino antissocial não estão sendo divulgados por risco de represálias. Essa é uma das regras de A Gazeta para o uso de fontes anônimas.

Longo processo
Desde 2017, o condomínio enviou várias solicitações para que os comportamentos inadequados fossem cessados, informando que ele iam de encontro às regras de convivência, mas o empresário se recusava a receber as notificações.

Outro caminho adotado foi a aplicação de diversas multas por infrações administrativas, que também não deram resultado. “Não surtiram o efeito esperado, já que sequer foram quitadas”, é dito na sentença.

Foi realizada ainda uma assembleia geral com todos os moradores. O empresário foi convidado, mas se recusou a assinar a carta convite e não compareceu ao encontro. Na reunião, realizada em maio deste ano, foi decidido, por unanimidade, pelo pedido de exclusão antissocial.

“No decorrer da assembleia, o proprietário e condômino antissocial espiou a assembleia, identificado pelas câmeras de segurança e pelos funcionários da portaria e não se fez presente na respectiva reunião de condomínio”, foi relatado na ata da assembleia e descrito na decisão judicial.

Direito de vizinhança
A decisão do juiz da 6ª Vara Cível de Vitória, considerada técnica e rara, analisou o embate entre dois direitos: o de propriedade e o de vizinhança. De acordo com o advogado que representa o condomínio, “a comunidade condominial não pode sofrer por quem abusa do direito de propriedade”.

Ele explicou que a decisão não implica na perda do direito de propriedade. O imóvel continuará pertencendo ao empresário, ele só não poderá morar nele ou usufruir da estrutura do prédio. Mas poderá alugar.

No processo, entre as provas apresentadas, foi informado que houve tentativas de contato com a família do empresário, sem sucesso. Ele tem 66 anos, mora sozinho no local há cerca de 8 anos.

Ao conceder o pedido de exclusão do condômino antissocial, o juiz considerou os seguintes pontos, segundo o descrito na decisão:

- Houve reincidência de condutas nocivas e antissociais praticadas pelo empresário, capazes de comprometer a segurança dos demais moradores e funcionários do prédio
- Em razão dessas condutas, foram aplicadas sanções pecuniárias em desfavor do empresário, sem eficácia
- Aprovação em assembleia de moradores de abertura de processo judicial para solicitar a exclusão do condômino antissocial
- Perigo de dano e risco causado pela  insegurança instalada no prédio diante do comportamento do empresário e que culminou com a contratação de segurança complementar 24h

O outro lado
A reportagem de A Gazeta aguarda um retorno do advogado de defesa do empresário. Quando isso ocorrer, esta matéria será atualizada.

Na decisão dos desembargadores, é informado que o empresário recorreu contra a sua expulsão informando que os problemas de convivência no condomínio se deram “em razão dos demais condôminos não aceitarem a convivência com seu irmão, o qual possuía deficiência”.

Argumentou ainda que “jamais foi notificado de qualquer das penalidades aplicadas pelo condomínio; que se trata de uma pessoa idosa, daí porque devem ser observados os direitos e as garantias inerentes à sua condição; e que a penalidade de expulsão do condomínio se mostra exacerbada e desproporcional”.

Fonte: Gazeta On-line