Para reter talentos, empresas se propõem a realizar sonhos dos funcionários

Quando era estagiário, Tercio Farias aplacou o sonho de um colega de trabalho sem querer. “Aquilo me arrasou”, conta. O episódio, no entanto, plantou a semente daquilo que viria a ser o propósito da Villa Camarão: um meio para transformar vidas e realizar sonhos. Hoje, CEO da companhia, o empresário contribui para tornar realidade alguns desejos dos funcionários, promovendo conexão e engajamento.

De forma estratégica, ele entende que perguntar o sonho de cada empregado ajuda no autoconhecimento da pessoa e faz a empresa compreender seu papel na oferta de desenvolvimento profissional.

O engajamento promovido traz benefícios e, consequentemente, leva à satisfação dos clientes. “O time vai se preocupar com o resultado do cliente, vai cuidar, entender como vender mais”, diz Farias. “Se o cliente tem um bom produto, vai comprar mais vezes.”

Práticas como essas de humanização no trabalho geram satisfação e fazem parte das políticas de empresas reconhecidas no Prêmio Gupy Destaca. A premiação acaba de divulgar as 100 companhias com os RHs mais inspiradores do Brasil, entre elas a Copastur, que figura no ranking pelo segundo ano consecutivo.

Na empresa de viagens e turismo, o time de pessoas e cultura também pergunta aos funcionários três sonhos, além do chocolate e de uma comida preferida. As respostas são usadas para ações especiais, como no anúncio de uma promoção.

Fernanda Souza, por exemplo, era recepcionista e tinha o sonho de viajar de avião pela primeira vez. Quando foi promovida, teve a surpresa de ver a mãe e a filha na companhia para lhe entregar uma caixa com o chocolate favorito dela, fotos de pessoas queridas e uma passagem aérea.

“Não imaginei que teria um dos sonhos realizado. Ver minha família aqui fez toda diferença”, diz ela, que se sente mais valorizada, autoconfiante e orgulhosa de si. Fernanda estava há um ano na Copastur e afirma que esse reconhecimento é estimulante. “Venho me desenvolvendo mais a cada dia, já tive mais duas promoções. Dou meu melhor para estar sempre conquistando o que almejo e agora olho o futuro de forma diferente.”

A supervisora de pessoas e cultura na Copastur, Areli Petta, diz que a iniciativa está conectada ao propósito da empresa. “Entendemos que precisávamos anunciar a promoção de forma mais humanizada e tocar mais o funcionário”, comenta. “Envolver o familiar, seja por vídeo, pessoalmente, por carta ou fotos, e estar próximo do colaborador facilita a gente entender a história dele, do que ele gosta.”

ESTRATÉGIA DE NEGÓCIO. Pesquisa da Gupy, em parceria com a Ideafix, mostrou que 40% dos 1 mil RHs entrevistados estão investindo em humanização de processos. Porém, só 14% dizem ter práticas personalizadas para gestão de pessoas. O diretor de recursos humanos, Gianpiero Sperati, diz que os dados refletem o aprendizado das empresas de como equilibrar o “fazer humanizado” com uso da tecnologia.

“São algumas fases pelas quais o RH passa.” Alguns anos atrás, diz ele, era tudo feito por pessoas. “No modelo de tecnologia, tudo é feito de forma massificada. Agora estamos entrando na fase 3.0, usando tecnologia personalizada.”

Como não há consenso sobre o que é humanização no trabalho, as ações são intuitivas. Ele diz que a prática passa por olhar cada um mais como pessoa, e menos como funcionário ou número na estrutura empresarial. “É preciso entender que as pessoas têm ciclos e momentos diferentes, que existe curva de adaptação e aprendizagem que traz olhar humano para o trabalho.” 

Na Betterfly, plataforma que estimula hábitos saudáveis, o propósito também é levado para dentro da empresa. Entre os valores da companhia, um deles é o sonhar grande, que se materializa com o programa Dreams Come True. Todo ano, três funcionários são sorteados para terem um sonho realizado. Outra iniciativa é o Sports Buddy, que incentiva a prática de atividade física e tem um teto de custo para apoiar jornadas.

Quem deseja correr uma maratona ou participar de um concurso de dança, por exemplo, pode receber suporte financeiro e treinamento com profissionais da modalidade. Jin Klaus Terada, gestor de contas da empresa, foi um dos beneficiados. Adepto às aventuras na natureza, ele uniu o bem-estar à realização de um sonho: escalar o Nevado Sajama, o monte mais alto da Bolívia. A viagem foi custeada pela companhia.

A chefe de pessoas e cultura da Betterfly Brasil, Virginia Vairo, diz que, para construir a cultura humanizada, a empresa realiza ações mensais com funcionários. Há desde formação de líderes, grupos de conversa e projetos de voluntariado.

BENEFÍCIOS. Para Ingrid Rapold, chefe de pessoas da Villa Camarão, a estratégia focada nos sonhos é uma forma de reter talentos. “As pessoas estão pedindo demissão porque o trabalho não faz mais sentido. Não olhar para isso é estar por fora do que está acontecendo no mercado. A pessoa não está buscando única e exclusivamente uma remuneração.”

Ela cita o exemplo de um funcionário que entrou na companhia como vendedor e desejava comprar uma casa para a avó. A empresa não deu o imóvel, mas contribuiu para a viabilidade dele. Com um plano e desempenho, o profissional evoluiu e se tornou sócio, tendo realizado o que almejava.

Areli Petta, da Copastur, afirma que proporcionar experiências únicas em momentos que a pessoa não espera é um diferencial. Na Betterfly, o retorno é visto na qualidade das relações e nas pesquisas semanais acerca de ações realizadas. “Numa escala de 1 a 5, nossa meta é 4 e temos ficado sempre acima. Ouvimos muito as pessoas”, diz Virginia.

Fonte: Estado de São Paulo