Como será o futuro dos escritórios após a pandemia de coronavírus

As mesas personalizadas, com porta-retratos, bonecos e plantinhas, estão com os dias contados. No escritório do futuro, no pós-pandemia, não há espaço para acumulação nem para objetos amontoados. Os mobiliários, separados por acrílicos, serão compartilhados e terão espaço apenas para o computador, na maioria laptops. Objetos pessoais, como bolsas e até material de escritório usado no dia a dia, ficarão armazenados em lockers (armários com cadeado), instalados em espaços distantes da área de trabalho.

As salas de reuniões terão sua capacidade reduzida e, em alguns casos, serão abertas para permitir maior ventilação no ambiente. Até mesmo janelas, inexistentes em alguns prédios, podem voltar a ter seu espaço. A ideia é criar alternativas para melhorar a circulação do ar e evitar que os vírus se propaguem no escritório.

Essas são algumas das propostas que vêm sendo feitas por arquitetos às empresas que querem mudar o layout dos escritórios ao fim do isolamento social. “Temos verificado uma demanda grande das companhias que buscam soluções para voltar ao trabalho nesse cenário desafiador”, afirma Douglas Enoki, gerente de arquitetura da IT’S Informov.

Ele conta que a preocupação dos clientes é reduzir o adensamento dos escritórios. E isso só é possível com espaçamento entre as mesas e maior rotatividade dos funcionários. Com o bom desempenho dos trabalhadores em home office durante a crise, as empresas entenderam que devem manter o trabalho remoto, pelo menos, por alguns dias da semana. Ou seja, o revezamento de trabalhadores nos escritórios será maior e exigirá menos mesas nos espaços.

TRABALHO REMOTO - “Experimentamos uma nova forma de trabalhar que está dando certo e vamos continuar com o desenvolvimento dessa cultura”, diz Antonio Carlos Duarte Sepúlveda, presidente da Santos Brasil, empresa que administra um dos maiores terminais de contêineres do País. A companhia contratou uma arquiteta para fazer mudanças no escritório, em São Paulo. “Estamos estudando um novo layout que, em função do home office, contemplará o compartilhamento de estações de trabalho, além de mais salas de reunião com equipamentos para videoconferência.”

Esse tem sido um pedido recorrente. A sócia do Studio BR Arquitetura, Bruna de Lucca, conta que está fazendo um projeto, neste momento, em que vai reduzir de 130 para 65 o número de mesas instaladas num escritório. “A empresa quer que, além do espaçamento, coloquemos divisórias de acrílico para separar as mesas e, assim, proteger os funcionários.” A área de café será ampliada de 70 metros quadrados (m²) para 100 m², e as salas de reuniões serão abertas.

SALAS DE REUNIÕES E JANELAS NO PÓS-COVID-19

A arquiteta Liana Tessler Szyflinger, do escritório Liana Tessler Arquitetura e Interiores, diz que as salas de reuniões têm sido uma grande preocupação das empresas no retorno pós-Covid-19. Em seus projetos, ela tem buscado criar salas com mesas em “U”, que permitem distância de 2 metros entre as pessoas. “Muitos escritórios estão mudando. Alguns, 100% do layout; outros, uma parte menor, pois o futuro ainda é muito incerto.”

Para a arquiteta Thaisa Bohrer, o escritório do futuro será mais pé no chão, com mais janelas, aberturas e ventilação. Na avaliação dela, o ambiente de trabalho no pós-pandemia será mais aconchegante e mais agradável. Haverá também mais espaços de descompressão para as pessoas se encontrarem quando não estiverem em home office. “Teremos um rompimento de tudo aquilo que vinha sendo adotado até agora”, diz a profissional. “Vamos eventualmente para o escritório e não teremos mais um porta-lápis e bonequinhos nas mesas, que serão multifuncionais e de multiusuários.”

É o que a XP Investimentos deve fazer no pós-pandemia. A ideia é transformar os escritórios atuais em escritórios-conceito, que servirão de apoio para demandas específicas de treinamento, dinâmicas presenciais, recepção de clientes e parceiros. “Vamos valorizar ambientes mais rotativos, mais comunitários”, diz o sócio e responsável pela área de Gente e Gestão da XP, Guilherme Sant’Anna. A empresa decidiu estender o home office até dezembro, mas mesmo depois muitos funcionários continuarão no trabalho remoto.

O arquiteto Roberto Loeb acredita que, no pós-pandemia, os encontros presenciais em escritórios serão em ocasiões específicas, como definir projetos, metas de trabalho ou treinamento. Para ele, os escritórios serão menores, com forte organização de espaços sociais e culturais para receber os funcionários nesses momentos. “Serão locais para o encontro de reforço dos laços entre colaboradores e diretores. A distância física será um processo a ser desenvolvido através de treinamento e orientações para que o trabalho seja eficiente e criativo.”

TECNOLOGIA E MAIOR HIGIENIZAÇÃO FARÃO DIFERENÇA NOS ESCRITÓRIOS DO FUTURO

Os escritórios do pós-pandemia de coronavírus terão muita tecnologia para evitar toques. Desde a porta de chegada até os banheiros, a ideia é criar sistemas de acionamento automático que evitem que os trabalhadores toquem nas peças. No controle de acesso dos funcionários, as empresas devem passar a adotar o QR Code (código de barras bidimensional) ou leitor facial ou de íris.

Nos banheiros, alguns projetos já preveem acionamento pelo pé para válvulas de descarga e automático para torneiras, saboneteiras e secadores de mãos. “Também há o acionamento por sensores de iluminação das salas para evitar o contato com os interruptores”, diz a arquiteta Liana Tessler Szyflinger.

ROTINAS DE LIMPEZA - Toda essa tecnologia terá de vir acompanhada de um novo protocolo em relação à higienização das áreas comuns. “A limpeza comum e periódica será substituída por rotinas diárias de higienização de ambientes e superfícies com produtos especiais, além de todos os materiais que adentrarem ao escritório”, destaca a arquiteta Bruna de Lucca.

Por isso, os projetos de novos layouts preveem bancadas externas para lavar as mãos, espaços para higienização dos calçados e totens com álcool gel, máscaras e luvas. Tudo isso na recepção das empresas, antes de entrar nos escritórios. “Após esse momento, muitas coisas terão de mudar. Além das rotinas de limpeza e mudança nos espaços, faremos a medição de temperatura para dar mais segurança aos funcionários que estarão no escritório”, diz Gabriela Duarte, gerente geral de Operações da Plug and Play Brasil, plataforma de inovação que vem fazendo mudanças no layout da empresa. Segundo ela, a expectativa é reduzir em 50% a ocupação do escritório e salas de reunião.

Outro ponto que deve merecer atenção é o sistema de higienização de ar condicionado. “A cada dois meses, é preciso fazer a limpeza dos aparelhos, mas hoje muitas empresas não cumprem essa determinação”, diz Bruna. No pós-Covid-19, esse tipo de postura terá de mudar, para não expor os funcionários a riscos de contaminação. “A dinâmica vai mudar, os espaços serão transformados e haverá redução das áreas de trabalho”, diz o arquiteto Renato Dal Pian, do escritório Dal Pian.

IMAGENS 3D – Uma das mudanças radicais dentro dos escritórios, na avaliação do arquiteto Roberto Loeb, vai ocorrer dentro das de reuniões. Ele afirma que a tendência, após esse período de confinamento, será a melhoria dos equipamentos e sistemas digitais para dar mais agilidade em reuniões à distância. “Hoje já temos esses instrumentos, mas sem dúvida teremos desenhos mais versáteis e leves com forte acessibilidade universal.” Ele aposta no uso de imagens 3D, holográficas, que permitirão aos executivos conversar e se reunir com outras pessoas como se estivessem fisicamente presentes.

Fonte: Estado de São Paulo