Medida Provisória 927 – Alguns comentários

A Medida Provisória 927 que dispõe sobre as medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação do emprego e da renda e para enfrentamento do estado de calamidade pública,  tão logo publicada, já sofreu inúmeras críticas, por parte do Congresso e associações de classes, inclusive, ANAMATRA (Associação Nacional Magistrados do Trabalho), levando o Governo a revogar o artigo 18, um dos mais polêmicos, que permitia suspender contratos e salários por 4 (quatro) meses.

Medida Provisória, o próprio nome diz, provisória, pois precisa ser votada no Congresso em 120 dias, sob pena de caducar, mas possui efeito de lei desde a sua publicação. Ressaltamos que várias MP´s editadas pelo atual Governo já caducaram, o que demonstra a falta de sintonia entre os Poderes.

I - NEGOCIAÇÕES AFASTANDO SINDICATOS – PREPONDERANCIA SOBRE LEIS, CONVENÇÕES E ACORDO COLETIVOS - INCONSTITUCIONALIDADE
Insiste o Governo em tentar impor acordo individual, afastando a participação dos sindicatos, precarizando as relações de trabalho, e, ainda, que esta vontade possa contrariar Leis, Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho.

O artigo 2° já é objeto de severas críticas por vários segmentos.

II – TELETRABALHO – TRABALHO REMOTO – HOME OFFICE – ARTs. 4° e 5°
A lei 13.467 (reforma trabalhista) já regula esta questão nos artigos 75-A a 75-E, da CLT, empresas privadas e públicas, incluindo Poder Judiciário estão incentivando o trabalho remoto ou home office.

A alteração do contrato de trabalho deve ser efetivada através de Aditivo, assegurando o equilíbrio e as condições de trabalho.

III – ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS – ARTs 6° ao 10
Por lei, as férias devem ser comunicadas com 30 dias de antecedência, o gozo não poderá ocorrer antes de 48hs de feriados e domingos e o pagamento com 48 horas antes do início desta.

A regra que estabelece aos trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do coronavírus (covid-19) serão priorizados para o gozo de férias, individuais ou coletivas, é bem-vinda, mas sequer precisava de norma legal, mas sim, política de recursos humanos de cada empresa.

Os pontos que merecem crítica referem-se aos prazos de pagamento das férias e do 1/3, contrários a legislação vigente e ao princípio protetivo deste descanso anual, fato que poderá gerar passivo trabalhista.

IV – FÉRIAS COLETIVAS – ARTs 11 e 12
Concede ao empregador maior facilidade na concessão das férias coletivas, flexibilizando prazos e comunicações previstas no artigo 139 da CLT.

Reduz de 15 dias para 48 horas a comunicação aos empregados, dispensa as comunicações aos sindicatos e Ministério da Economia, além de acabar com o prazo previsto no § 1° que prevê “As férias poderão ser gozadas em 2 (dois) períodos anuais desde que nenhum deles seja inferior a 10 (dez) dias corridos”.

V - DO APROVEITAMENTO E DA ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS
Esta questão sempre foi objeto de Convenções ou acordos coletivos de trabalho, não havendo lógica em imposição unilateral por parte do empregador, mesmo prevendo que o aproveitamento de feriados religiosos dependerá de concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.

VI - DO BANCO DE HORAS – Art. 14
O § 5°, do art. 59 da CLT já regulamenta esta questão, mediante acordo individual, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses.

A novidade é a compensação no prazo de até dezoito meses, contado da data de encerramento do estado de calamidade pública e que a compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual ou coletivo.

VII - DA SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO – Arts. 15 a 17
Suspender a realização dos exames ocupacionais durante o estado de calamidade talvez não tenha sido a melhor indicação, retira do empregador uma segurança na implementação do seu programa de controle médico de saúde ocupacional, mesmo havendo a hipótese de o médico coordenador considerar risco e indicar a realização destes exames.

A ampliação da dispensa do exame demissional no caso do exame médico ocupacional tenha sido realizado há menos de cento e oitenta dias, também não protege a ninguém (empregador e empregado), pois poderá gerar passivo trabalhista, o que NÃO é indicado.

Postergar os treinamentos exigidos por lei, relacionado a segurança do trabalho, provoca mais riscos ao empregador, responsável pela saúde dos empregados e das ações ou políticas relacionadas.

VIII – SUSPENSÃO CONTRATO DE TRABALHO POR QUATRO MESES
Revogado pelo Governo diante das inúmeras críticas, afinal, ou o empregado estava sujeito a morrer pelo vírus ou de fome (sem salário).

IX - RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO
A suspensão do recolhimento do FGTS nos meses de março a maio de 2020 independente do porte da empresa, não guarda urgência, ademais, postergar o recolhimento parcelado em até seis parcelas a partir de julho/2020 é prejudicial aos empregados, pois, sem incidência de correção e juros, o que poderá ser afastado pela Justiça do Trabalho.

X – CONTAMINAÇÃO POR CORONAVÍRUS NÃO É DOENÇA OCUPACIONAL
A medida provisória ao dispor no artigo 29 que “Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”, antecipou uma discussão, sem sentido no momento, o que poderá acirrar os ânimos.

XI – PRORROGAÇÃO DAS CONVENÇÕES E ACORDOS COLETIVOS
O Artigo 30 prevê que os acordos e as convenções coletivas vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias, após o termo final deste prazo.

Ora, deixar a critério do empregador prorrogar convenções ou acordos, fruto de negociação coletiva, desprestigia as entidades sindicais e afasta o direito a negociação coletiva.

CONCLUSÃO
A Medida Provisória 927 já nasceu com profundas críticas, levando o Governo a revogar o artigo 18, dando espaço e vazão a conturbada relação com o Congresso e sociedade organizada, o que poderá implicar em mais dificuldades do que soluções que pretendia oferecer.

No Congresso, poderá virar um mastodonte com centenas de emendas ou ao final caducar.

As empresas, neste momento de crise, devem se ater aos instrumentos legais introduzidos pela lei da reforma trabalhista e da liberdade econômica, procurando soluções criativas e negociadas com as entidades sindicais.